1. Voltar às origens para sermos fiéis ao presente.
Nos tempos de crise, a Igreja sempre firmou e confirmou sua doutrina. Isso se dá, de modo especial, no campo do matrimônio e da família! A Igreja sempre defendeu o matrimônio e a família em tempos em que contra-valores foram propostos. Dessa forma, confirmou e confirma a dignidade, o realismo e a conveniência do Sacramento do Matrimônio.
O Matrimônio é uma realidade da Criação e da Redenção. Com toda a tranquilidade, podemos afirmar que o Matrimônio e a família são ideias de Deus, não invenções da Igreja ou imposições religiosas e culturais.
De fato, vivemos tempos de mudança, tempos de questionamentos de valores, de nivelamento por baixo! Nossos meios de comunicação e muitas instituições têm colaborado para que percamos o senso de equilíbrio em questões primordiais que tocam a vida. Matrimônio e família estão em meio a essas questões. A mudança do mundo rural para o mundo urbano e as influências no papel do homem e da mulher na construção da sociedade fizeram com que aquilo, que era natural-estático, passasse a uma conceituação histórico-dinâmica. Como responder a esses desafios?
Parece-nos que o progresso e a técnica substituem a Verdade! Isso traz um grave problema: o homem quer libertar-se da Verdade. Porém, somos libertos pela Verdade e para a Verdade. É hora de resgatar a Verdade sobre o Matrimônio e a família.
Diz um provérbio africano: “Se você não sabe para onde vai, com certeza sabe de onde veio. Então volte para lá!” Jesus nos convida a isso, em se tratando de Matrimônio. Quando O questionam sobre a carta de divórcio, Ele responde com uma pergunta… Coisas de grande Mestre e Sábio: “Moisés, o que dizia?” Em seguida, completa, Moisés permitiu dar a carta de divórcio devido à “esclerocardia” de vocês, pois no princípio não foi assim… (cf. Mt 19, 3-12). Usamos este termo (esclerocardia = esclerose do coração) para dizer que o coração do ser humano é que se esqueceu do sonho de Deus. É preciso voltar ao princípio. Mais uma vez isso se faz historicamente necessário.
O que Deus pede de nós? Temos que profeticamente anunciar a verdade sobre o Matrimônio e a família; mais que isso, temos que testemunhar com a vida a diferença que o amor, levado a sério, faz à sociedade.
Ele nos criou homem e mulher… O homem encontrou uma auxiliar que lhe correspondesse… “Esta sim é carne da minha carne, osso dos meus ossos”. Esse foi o primeiro canto, a primeira poesia nascida do coração do homem (cf. Gn 2, 21-24). Os dois, mais que se completam, vivem entre si uma reciprocidade assimétrica, ou seja, um enriquecimento mútuo, entre diferentes, que revela ao mundo o ser imagem e semelhança de Deus.
Mulher e homem são chamados à celebração de um amor tão forte, mais forte que a morte (cf. Ct 8,6). Amor que se tornou parábola viva do amor de Deus pela humanidade. Todo casal é e deve ser uma epifania do Amor de Deus!
2. Uma analogia possível.
O amor do casal manifesta o ponto de partida para compreendermos o amor de Deus. Sendo assim, Mistério Pascal e Mistério Nupcial se encontram! O Mistério Pascal ilumina e torna compreensível o Mistério Nupcial. É essa a verdade que anunciamos e a missão que cumprimos. Os três elementos que compõem o Mistério Nupcial são diferença sexual, amor e fecundidade.
Vamos contemplar a cena do Calvário e o casal! Ali os três elementos se fazem presentes, tanto numa realidade quanto em outra. O Novo Homem encontra-se com a Nova Mulher (Jesus e Maria). Ninguém melhor que Maria para receber, em nosso nome, o Divino Esposo. Um amor sem fim, de doação e firmezas extremas, acontece. E, como o amor se difunde, logo a fecundidade se dá. Nasce a Igreja. Nascem os filhos da Igreja de Jesus Cristo: João, o Bom Ladrão… todos nós.
No Matrimônio, estes três elementos devem estar presentes: diferença sexual, amor e fecundidade. Repito-os, pois hoje se faz necessário, profeticamente, sublinhar o que é básico para mergulharmos nesse mistério.
A separação desses elementos traz efeitos bombásticos à humanidade. Diz o Cardeal Angelo Scola, Patriarca de Veneza, “um efeito comparável ao da bomba atômica, pois não temos ideia de suas reais conseqüências”. Infelizmente, é o que vemos atualmente. Hoje temos sexo sem amor, amor sem sexo, sexo sem filhos, filhos sem a relação sexual (produzidos tecnicamente), sexo sem respeitar a diferença sexual, e por aí vai.
3. Um resgate de papéis.
Temos que resgatar os papéis fundamentais do casal, homem e mulher, com seus atributos específicos, revelando juntos ao mundo a riqueza do ser humano, imagem e semelhança de Deus. Celebramos no Matrimônio um amor que gera vida, a partir da qualidade de vida que marido e mulher se dão mutuamente. O ideal seria que um dissesse ao outro diariamente: “Casei-me contigo para ter o privilégio de te amar, para poder te amar”. Um amor que amadurece e que se solidifica. Um amor que muda de nome, que nasce de um encantamento, de uma paixão e que gera cumplicidade, corresponsabilidade, doação plena de vida, compromisso definitivo.
A sociedade, marcada pelo individualismo, pelo consumismo, pelo utilitarismo, pelo relativismo e pelo subjetivismo, parece ter riscado do dicionário as palavras renúncia e sacrifício. O amor do casal e da família exige sacrifício. “Quem nunca sofreu é porque nunca amou! É preciso amar até doer, senão não foi amor…”(Madre Teresa de Calcutá).
Hoje precisamos resgatar o papel do masculino e do feminino na família.
Resgatar o papel da mulher: ela é o esteio da família. É a que expressa firmeza e que dá identidade à família. A sua presença é imprescindível junto aos filhos. É presença enriquecedora e fundamental na sociedade. A mãe é insubstituível na primeira infância e na adolescência dos filhos.
Resgatar o papel do homem: ele é o que ensina a relação de troca, é o que semeia ideais na vida do filho, é o que dá segurança e proteção. Porém, o que constatamos em muitos casos? Quanta imaturidade masculina, quanto egoísmo!…
O equilíbrio dos papéis de pai e de mãe traz identidade e maturidade ao lar e faz com que confirmemos que, de fato, a família é uma “escola de pessoas”, “escola de humanidade”, “escola do amor”.
Na família, os filhos são dons, não são direito nem posse… Vale a pena relembrar o que nos diz a Carta aos Colossenses: “Pais, não irriteis, não intimideis os vossos filhos para que não desanimem” (cf. Cl 3, 21). Olhando para um filho, a constatação dos pais deve ser a mesma: nada mais nosso e, ao mesmo tempo, nada mais recebido.
Como escreveu Khalil Gibran: “Vossos filhos não são vossos filhos… são flechas arremessadas. Vêm através de vós, mas não de vós, e embora vivam convosco, não vos pertencem… Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos”.
“O grande segredo da educação está no amor mútuo do pai e da mãe, que se torna o pão cotidiano da criança. É servindo aos filhos, que o casal se esforça cada dia para se tornar mais semelhante a Deus, e assim revelá-Lo mais claramente.” (Pe.Henri Caffarel)
O filho tem o direito de ter as referências masculinas e femininas para um crescimento e desenvolvimento de sua personalidade.
4. Alguns conselhos.
Baseado em algumas leituras sobre a espiritualidade do casal, resumo aqui alguns conselhos muito práticos.
Primeiramente um lembrete: a espiritualidade não é um anexo na vida do casal e da família, mas é o que faz com que sejam casal e família com tudo o que isso significa.
O sinal inconfundível do amor é a dedicação a quem amamos! Os principais inimigos do amor são o egoísmo e seus filhos. Os combustíveis do amor para o dia a dia sãos os afetos e as delicadezas dispensados em nossas casas! Não podem faltar na vida conjugal e familiar: paciência e perdão.
Em meio a tantas situações caóticas, nossa Pastoral Familiar deve ser uma mensagem viva de que para Deus nada é impossível! Deus quer restaurar nossos casais, nossas famílias! Onde pensamos não haver caminho, Deus faz um! Os obstáculos atuais nos desafiam em nosso profetismo. Devemos anunciar com todas as forças, no cumprimento de nossa missão, que amor não se faz, amor se vive e celebra!
Bibliografia:
1. BORSATO, B., Vida de Casal. Linhas de espiritualidade conjugal e familiar. São Paulo: Paulinas, 1998.
2. MAZZANTI, G., Teologia sponsale e sacramento delle nozze, Bolonha: Dehoniani, 2002.
3. MOSER, A. O enigma da esfinge. A sexualidade. Petrópolis: Vozes. 2003
4. RAMOS, Dalton Luiz de Paula, Bioética – Pessoa e Vida, Difusão Editora, 2009.
5. SCOLA, A., Uomo-Donna. Il caso serio dell’amore. Gênova: Marietti, 2002.
6. João Paulo II , Missão da família cristã no mundo de hoje (A) Doc. 100. São Paulo: Paulinas, 1981.
Pe.Rinaldo Roberto de Rezende