A situação criada ao redor da Comissão Parlamentar de Direitos Humanos e de seu Presidente Dep. Marco Feliciano revela fragilidade da nossa democracia, pouco apta para abrir diálogo franco e respeitoso acerca de problemas delicados. Faltando disponibilidade ao diálogo, sobra apenas espaço para manifestar posições diversas através de gritos e desqualificação do adversário. Estas atitudes caracterizam os dois lados do conflito.
O diálogo traz consigo a capacidade de considerar cada pessoa em sua dignidade própria, dando atenção a seus dramas. Dessa maneira, o conflito vivido aos gritos pode ser trazido para o plano da racionalidade em busca de respostas que levem em consideração o maior bem possível para cada um, no horizonte da busca do bem comum.
A percepção do adversário político como de um inimigo cuja influência deve ser neutralizada ou reduzida ao mínimo leva a um impasse. Muitos exemplos históricos de forças ideológicas e políticas que tentaram eliminar-se reciprocamente produziram enormes sofrimentos a inteiras populações. Em lugar de lutar na tentativa de reduzir a zero a pessoa do adversário portador de diferentes opções de vida, é mais conveniente reconhecer o outro, sua dignidade, para dar início a efetivo diálogo.
Nossa democracia pode ser mais plena se se abre ao diálogo, à ponderação, ao uso da razão.
Cabe a nós católicos, iluminados pela experiência de sermos “membros uns dos outros” abrir este caminho. A Igreja não se coloca como uma das partes neste conflito. Sua contribuição é apontar horizonte e critérios adequados para enfrentar o problema, pois a política não se basta a si mesma. Quando falta outro ponto de referência maior do que ela, não se enxergam outras possibilidades a não ser medir forças, produzindo choques desumanos.
É conveniente olhar para Jesus Cristo ressuscitado, o único que responde aos anseios de felicidade que estão no coração do todo ser humano. Nele é possível fazer a experiência de uma positividade capaz de abraçar todos os dramas humanos. Afirmar o valor do outro e o bem comum acima de qualquer interesse ideológico abre caminhos de respostas para as questões em pauta.
A busca da felicidade individual levanta questões morais nas democracias modernas, porque não podem ser ignorados aspectos dessa busca que afetam outras pessoas. Os critérios para encontrar respostas aos problemas que geram conflitos com a Comissão Parlamentar dos Direitos Humanos não podem coincidir com juízos subjetivos de caráter emocional. Exige-se muita ponderação quando o exercício da liberdade individual tem consequências negativas para o bem público. Deve-se deixar espaço para a liberdade individual que busca realização e felicidade sem ignorar que essa liberdade individual deve ser preterida quando compromete o que é bom para o conjunto da sociedade.
+João Carlos Petrini
Bispo de Camaçari – BA