Costurar uma roupa rasgada, ou até mesmo fazer uma novinha em folha, dar bainha, pregar um botão, preparar o jantar para o marido e escolher dar à luz em casa não são mais tarefas feitas apenas pelas vovós. Mulheres do século XXI, que têm curso superior e trabalham fora, também desempenham cada vez mais essas atividades.
É o caso da administradora de empresas Cristiane Cicarini, de 30 anos, casada há seis anos. Ela faz o curso de modelagem, corte e costura em uma escola no bairro Carlos Prates, na Região Noroeste de Belo Horizonte. Cristiane disse que se interessou pela empreitada porque é uma forma de manter o que era feito tradicionalmente pela mãe e avó.
“Minha mãe ficou tão satisfeita quando eu fui fazer o curso que me deu uma máquina de costura”. Cristiane contou ainda que o marido também se animou com a iniciativa da mulher. “Ele mandou fazer etiquetas [de pano] com o meu nome para serem colocadas nas roupas que eu fizer”, disse. Com 12 aulas, ela já criou cinco peças, inclusive a que usava na entrevista.
A colega de curso, a bióloga Eloiza Macedo, de 43 anos, também é ca-sada e trabalha fora, mas arrumou um espacinho na agenda profissio-nal para aprender a costurar. “Voltar às origens é muito bacana. Além disso, com o que fazemos, mantemos o nosso próprio estilo. Lembro da minha tia e da minha sogra que faziam moldes com jornais. Hoje, eu faço com papel craft”.
Eloiza disse que, antes das aulas, sequer sabia pegar na agulha. Com o aprendizado, já tem quatro peças produzidas. Para o marido, pretende fazer camisas e bermudas. “Ele acha tudo lindo”, disse Eloiza, referindo-se às roupas que costurou. O marido também apoia a iniciativa da mulher e deu para ela uma máquina de presente.
Já a fonoaudióloga Cristiane Mesquita, de 32 anos, herdou da avó uma máquina de costura, e também se sente à vontade em meio aos tecidos, agulhas e botões. “Desde pequena eu sempre gostei de fazer roupinhas para as minhas bonecas. Agora estou fazendo as minhas”. Em seis aulas, Cristiane já criou duas peças e disse que quer costurar roupas para o marido pedalar. “Ele me apoia”.
A farmacêutica Liliane Colen, de 26 anos, que também é professora de dança, disse que não consegue achar costureira que faça roupas para as suas apresentações. “Agora posso eu mesma apertar e abrir uma roupa, fazer bainha e colocar um botão”, disse Liliane, levando-se em conta a praticidade.
A professora e proprietária da escola de moda, corte e costura, Laura Riz, explicou que, em quatro anos, desde que abriu o negócio, as mulheres bem resolvidas e estabelecidas profissionalmente têm procurado pelas aulas. “O aprendizado da criação é prático, fácil e fascina todas elas”. Atualmente, Laura tem quase 200 alunas com esse perfil.
Jantar romântico
A cerimonialista Mariella da Fonseca Carvalho, de 30 anos, casada há seis meses, também não hesita em agradar o marido, ou melhor, o estômago dele, quando prepara um jantar romântico. Ela fez um curso para organizar eventos, mas a paixão pela função virou trabalho profissional. Mariella deixou a carreira de fisioterapia para cuidar de etiqueta, eventos e boas maneiras.
Conhecimentos que ela aplica em casa com o marido, parentes e amigos. Com carinho, Mariella monta uma mesa impecável com talheres, louças e guardanapos. “Mas a gente não pode constranger os convidados. Eles precisam ficar à vontade à mesa”, defendeu.
Além dos jantares, Mariella garantiu que o curso também deu orientações de como organizar a própria casa e até mesmo planejar a semana. “A gente que trabalha fora precisa ter o mínimo de organização”. Ela tem uma jornada profissional de cerca de oito horas diárias.
Ajuda Natural
Foi a experiência como Doula– profissional que apoia mulheres grávidas antes, durante e após o parto – que confirmou a vontade da naturopata Luana de Olveira Mantegazza, de 26 anos, de ter o filho em casa, de forma natural, com o mínimo de interferências.
Durante a gravidez, ela teve acompanhamento de um médico, com quem realizou o pré-natal, e de enfermeiras obstetras, que também a auxiliaram no nascimento do pequeno David Aruam, hoje com 1 ano e 6 meses.
Luana buscava um parto mais humanizado e encontrou esse conforto no lar. “A casa é o lugar onde a mulher tem mais privilégio de ter um parto como ela quer, sem tantas intervenções médicas, que muitas vezes são desnecessárias. A mulher tem mais condição de estar em um estado de mais paz com ela mesma”, explicou.
A naturopata contou que o parto foi assistido pelas enfermeiras obstetras, por uma doula e pelo marido. Nada de anestesia para aliviar as dores do longo trabalho de parto; somente massagens e relaxamento. “Não posso dizer que é fácil e que não dói nada. A gente passa por nossos limites de dor e de segurança, mas quando a mulher esta autoconfiante ela consegue passar por tudo”, afirmou.
O nascimento de David Aruam acabou acontecendo na cama de Luna, mas antes ela já havia passado por uma banheira e por uma sauna indígena. Muitas mulheres que realizam o parto em casa optam pela posição de cócoras, mas a neuropata teve o bebê deitada de lado. “Não tem regra, cada mulher tem o seu sentimento ali na hora. Só no momento, vamos saber como o corpo vai pedir para ter o bebê”, disse.
De acordo com a mestre em filosofia e especialista em psicologia e gênero, Marisa Sanabria, este resgate das mulheres é um gesto de resistência ao mundo globalizado e de humanização do tempo. Para a psicóloga, a busca pela vida à moda antiga não é uma forma de submissão, mas uma maneira de reação contra a rotina de múltiplas jornadas. “As mulheres entraram no mundo do trabalho, mas não reduziram o trabalho em casa. Quando nos ocupamos em fazer um bolo ou em costurar, por exemplo, estamos propondo uma reestruturação do tempo”, explicou.