Após visita pastoral à Ásia, durante o voo de retorno ao Vaticano, na segunda-feira, 19, o papa Francisco atendeu aos jornalistas, em coletiva. Entre os assuntos abordados, o pontífice foi questionado sobre o que diria às famílias que tinham mais filhos do que podiam criar e sobre as proibições da Igreja Católica referente ao controle artificial de natalidade.
“Algumas pessoas pensam – e desculpem minha expressão aqui – que, para ser um bom católico, eles precisam ser como coelhos. Não. Paternidade tem a ver com responsabilidade. Isto é claro”, respondeu o papa. Durante a conversa, Francisco se manteve firme contra o controle de natalidade artificial e acrescentou que uma nova vida é “parte do sacramento do matrimônio”.
Reflexões com base
Em entrevista ao jornal “O Globo”, o bispo de Camaçari (BA) e presidente da Comissão Episcopal para a Vida e a Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), comenta a declaração do papa Francisco sobre a “paternidade responsável” e a outras perguntas feitas pelo jornal.
Confira a versão apresentada na matéria publicada pelo “O Globo” (22/01/2015) e, abaixo, a entrevista completa com dom Petrini, que explica com base nos ensinamentos da Igreja, os questinamentos enviados pelo jornal. As falas do presidente da Comissão Vida e Família não foram publicadas pelo “O Globo”.
O Globo: Ao afirmar que “católicos não devem se reproduzir feito coelhos”, o Papa Francisco sinaliza uma mudança na doutrina da Igreja quanto ao conceito de família?
Dom Petrini: O Papa Francisco não deixa de surpreender os observadores com seu estilo que quebra protocolos e fala dirigindo-se principalmente às pessoas simples do que aos teólogos e intelectuais em geral. Na entrevista dada durante a viagem de retorno das Filipinas, o tom era evidentemente coloquial. E nesse tom fala de realidades importantíssimas.
Em primeiro lugar, alude a uma mentalidade que, especialmente a partir dos anos 60 fala em tons alarmistas da “explosão demográfica”, alegando que a pobreza de muitos povos se deve a uma espécie de ânsia reprodutiva dos mais pobres. Por esse caminho, muitos países alcançaram taxas negativas de natalidade, com graves problemas sociais, tais como o envelhecimento da população, isto é, com a presença de um contingente de idosos muito mais numeroso que de jovens. Isto gera graves desequilíbrios na sociedade, podendo levar à falência as caixas de governos que não têm como pagar os benefícios previdenciários dos idosos e seus cuidados médicos.
Na quarta feira, 21 de janeiro, durante a audiência na sala Nervi, o Papa lembrou que “a causa principal da pobreza é um sistema econômico que tirou a pessoa do centro e colocou no lugar o deus dinheiro; um sistema econômico que exclui, exclui sempre: exclui crianças, idosos, jovens, desempregados, e cria a cultura do descarte.”
O Globo: O senhor poderia explicar brevemente o conceito de “paternidade responsável”? Se positivo, desde quando ele é aceito?
Dom Petrini: O Papa Francisco se referiu à paternidade responsável, que é um conceito usado pela Igreja há muito tempo e incorporado pelo Beato Papa Paulo VI na Encíclica Humanae Vitae, de 1968. O conceito foi sempre mais popularizado e está presente no Catecismo da Igreja Católica, de 1992. O número 2368 deste documento afirma: “Um aspecto particular desta responsabilidade diz respeito à regulação dos nascimentos. Por razões justas, os esposos podem querer espaçar os nascimentos de seus filhos”. Paternidade responsável é, então, a atitude dos esposos que, avaliando suas condições (econômicas, de saúde, etc.) decidem quando ter um filho e quando esperar. O mesmo número acima recordado acrescenta: “Cabe-lhes verificar que seu desejo não provém do egoísmo, mas está de acordo com a justa generosidade de uma paternidade responsável”.
O Papa recorda o que sempre a Igreja disse: que não corresponde à dignidade humana agir por puro instinto, pois atitudes dominadas pelo instinto são próprias dos animais (no caso, o Papa lembrou dos coelhos, considerados muito prolíficos pela imaginação popular).
O Globo: Existe algum método contraceptivo ao qual a Igreja mantém posição favorável?
Dom Petrini: Durante a entrevista, O Papa diz conhecer muitos métodos que são eficazes para regular a fecundidade e que não são artificiais. De fato, nos últimos anos, a ciência médica tem avançado muito no aprimoramento de métodos naturais que dão o casal a possibilidade de regular o número de filhos. Trata-se de métodos que exigem e promovem um entrosamento entre os esposos, um permanente diálogo, uma sintonia fina, isto é, atitudes que constituem uma extraordinária riqueza em suas relações íntimas. Os interesses dominantes são mais favoráveis a outros métodos que necessitam de artefatos produzidos por indústrias e que, portanto, rendem lucros ingentes. Essa é a razão principal pela qual estes métodos veiculam intensa propaganda e recebem o consenso de todas as formas de poder.
O Globo: Quais são os motivos doutrinários para que a Igreja seja contra métodos contraceptivos artificiais como preservativo ou pílula?
Dom Petrini: Esta pergunta envolveria um longo estudo. Posso apenas dizer que a Igreja sempre zelou e zela para que nada de externo ou artificial se interponha na expressão da intimidade, na vivência do amor humano. Este cuidado visa não tirar a responsabilidade de uma das partes, quase sempre o homem, nos cuidados com os efeitos das relações sexuais, porque isto poderia transformar a sexualidade num lazer e a mulher num brinquedo. Nesses casos, poderiam faltar a consideração e o respeito necessários para que o relacionamento entre homem e mulher se desenvolva na plenitude da dignidade e seja fonte de satisfação e verdadeira realização humana.
Assessoria de Imprensa CNPF/com Comissão Vida e Família.