Mais uma vez, os meios de comunicação noticiam um caso de estupro de menor, seguido de gravidez e aborto – desta vez, em Governador Valadres (MG). Como defensores, promotores e cuidadores da vida, temos a urgente necessidade de refletir sobre a vulnerabilidade e perigos que nossas crianças estão enfrentando. E pior, dentro das próprias casas.
Especialistas apontam que 90% dos casos de violência sexual e outros tipos de violência contra crianças e adolescentes ocorrem no ambiente familiar, praticados por aqueles que deveriam proteger. Neste tempo de pandemia, a organização não governamental World Vision estimou que até 85 milhões de crianças e adolescentes, entre 2 e 17 anos, poderiam se somar às vítimas de violência física, emocional e sexual no mundo inteiro.
Recordando que “uma violência vai gerando outras violências”, o bispo de Rio Grande (RS) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, dom Ricardo Hoepers, motiva a reflexão: “Que soluções podemos buscar para proteger nossas crianças dentro das famílias?”.
Realidade conhecida
As reflexões que formam os agentes da Pastoral Familiar no Brasil já indicam o contexto social em que se deve agir evangelicamente: “Na situação atual, entre os vários desafios, cresce a violência na família e em toda a sociedade”, lê-se no Guia de implantação “Pastoral Familiar na paróquia”. O mesmo material aponta que é urgente e necessário dar uma atenção bastante especial à família hoje. “E cada um de nós é chamado a fazer alguma coisa por ela”.
Em sua missão, a Pastoral Familiar que ser um sinal forte de presença e atuação junto às famílias. Assim, é imperioso que sejam oferecidas pistas de ação e apoio às famílias.
Entre as ações já realizadas, mas impactadas nesse tempo de pandemia, estão os Centros de Escuta, Orientação e Acompanhamento, mantidos pelas dioceses e operacionalizados pela Pastoral Familiar com ajuda de profissionais de diversas áreas.
No Setor Casos Especiais do Regional Nordeste 1 da CNBB, que corresponde ao estado do Ceará, é promovida, desde 2017, uma grande conscientização através das formações como prevenção, bem como algumas diretrizes de como acolher, cuidar e encaminhar pessoas/famílias feridas.
Nas formações realizadas nas dioceses, os agentes abordam a exploração e o abuso sexual de crianças e adolescentes, a situação de meninas grávidas e a necessidade de cuidar da proteção dos menores.
Como agir
O trabalho de conscientização das famílias tem sido a principal ferramenta para enfrentar a realidade dos abusos. Em campanha realizada anos atrás, o Ministério dos Direitos Humanos e o Ministério da Justiça indicaram atitudes simples que podem ajudar a proteger as crianças da violência sexual: Os pais devem ouvir com atenção o que seus filhos têm a dizer e orientá-los. Outro ponto importante ressaltado é a necessidade de saber com quem o filho está nos momentos de lazer e conhecer seus círculos de amizade também.
A assistente social Cristina Caetana Nascimento de Araújo, no terceiro mandato de Conselheira Tutelar em Ceilândia (DF), reforça a importância de a família dar educação sexual às crianças como uma base para proteger do abuso sexual.
“A prevenção do abuso vem acompanhada de educação sexual. Quando os pais dão essa orientação para seus filhos, fica mais fácil. Claro, é preciso acompanhar, conhecer seu filho. Geralmente a gente deixa essa orientação em educação social para a escola, para o vizinho, para os amigos, e essa orientação tem que ser dada pela família, porque nem tudo que a escola coloca, o que a sociedade coloca é aquilo que a gente acredita”, ensina.
A educação sexual para as crianças pode ajudar para que a criança não fique confusa quando acha que está recebendo um carinho.
“Eu sempre falo sobre esses ‘carinhos’ até na família mesmo: pai estar beijando na boca dos filhos, tomando banho junto… as crianças começam a acreditar que tudo isso é muito normal, aí quando ela está sendo abusada ela não entende que aquilo é abuso. Por isso a importância de educação sexual, porque os pais vão começar a explicar para os filhos o quê que pode e o que não pode, que tipos de carinho realmente é carinho e o que é abuso”, salienta.
Cristina ainda reforça que a criança muda o comportamento quando há algo que a incomoda. Isso pode ajudar a identificar um possível abuso. Após confirmada a violência contra a criança, a orientação é procurar a delegacia, de preferência a especializada na Proteção à Criança e ao Adolescente. Nesse contexto, o Conselho Tutelar age no encaminhamento à rede de proteção, como os Centros de Referência e Assistência Social (CRAS), hospitais, psicólogos, entre outros serviços.
Algumas dicas importantes
Para prevenir casos de violência sexual infantojuvenil:
Fonte: Senado Federal e atualizado pelo MPSC em maio de 2014
- cuide de seu filho: dê a ele toda a atenção que puder;
- saiba sempre onde eles estão, com quem estão e o que estão fazendo;
- ensine-os a não aceitar convites, dinheiro, comida e favores de estranhos, especialmente em troca de carinho;
- sempre os acompanhe em consultas médicas;
- converse com seus filhos: crie um ambiente familiar tranquilo;
- conheça seus amigos, principalmente os mais velhos;
- supervisione o uso da internet (Facebook, Twitter, chats, etc.); e
- oriente seus filhos a não responderem e-mails de desconhecidos, muito menos enviarem fotos ou fornecerem dados (nome, idade, telefone, endereço, etc.), ou, ainda, informarem suas senhas da internet a outras pessoas, por mais amigas que sejam.
Quando é descoberto um caso de violência sexual contra menores
Fonte: Fórum Catarinense Pelo Fim da Violência e da Exploração Sexual Infantojuvenil
- não critique nem duvide de que ela/ele esteja faltando com a verdade;
- incentive a criança e/ou o adolescente a falar sobre o ocorrido, mas não o obrigue;
- fale sempre em ambiente isolado para que a conversa não sofra interrupções nem seja constrangedora;
- evite tratar do assunto com aqueles que não poderão ajudar;
- denuncie e procure ajuda de um profissional;
- converse de um jeito simples e claro para que a criança e/ou o adolescente entendam o que você está querendo dizer;
- não os trate com piedade e sim com compreensão;
- nunca desconsidere os sentimentos da criança e/ou do adolescente;
- reconheça que se trata de uma situação difícil; e
- esclareça à criança e/ou adolescente que a culpa não é dela/dele;